Um retrato da fé moderna: o que a pesquisa State of Theology 2025 revela sobre a crença em Deus, a Bíblia e o futuro da igreja cristã
Em setembro de dois mil e vinte e cinco, a Ligonier Ministries, em parceria com a Lifeway Research, divulgou uma nova edição da pesquisa State of Theology, que há mais de uma década mede o que os americanos realmente acreditam sobre Deus, Jesus, a Bíblia, o pecado e a salvação. O levantamento entrevistou mais de três mil adultos em todo o território dos Estados Unidos e revelou um cenário misto: há crenças que ainda refletem o cristianismo bíblico, mas também uma confusão teológica cada vez mais evidente — inclusive entre pessoas que se identificam como cristãs ou evangélicas. Embora o estudo tenha foco norte-americano, suas conclusões ecoam entre igrejas de todo o mundo e servem como um alerta para o Brasil, onde o crescimento numérico da fé cristã nem sempre tem sido acompanhado por profundidade doutrinária.

A pesquisa revelou, por exemplo, que setenta e um por cento dos entrevistados acreditam na Trindade, reconhecendo que há um só Deus em três pessoas: Pai, Filho e Espírito Santo. Esse número é animador, mas quando a mesma amostra foi questionada sobre o Espírito Santo, cinquenta e sete por cento disseram acreditar que Ele é apenas uma força, e não uma pessoa. Ou seja, muitos afirmam crer na Trindade, mas negam na prática a personalidade do Espírito. A confusão aumenta quando sessenta e cinco por cento dizem que “Deus aceita a adoração de todas as religiões, incluindo cristianismo, judaísmo e islamismo”. Essa visão pluralista, embora pareça tolerante, contradiz o ensinamento de Jesus de que “ninguém vem ao Pai senão por mim” (João 14.6). Em outras palavras, o estudo mostra que boa parte dos americanos quer um Deus amoroso e universal, mas não necessariamente o Deus revelado nas Escrituras.
Outro ponto relevante está relacionado à natureza humana e ao pecado. Aproximadamente sessenta e seis por cento dos entrevistados afirmaram que “todas as pessoas pecam um pouco, mas a maioria é boa por natureza”. Esse tipo de pensamento reflete a cultura contemporânea, que tende a minimizar o pecado e exaltar a bondade humana. A Bíblia, porém, ensina o oposto: “Todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus” (Romanos 3.23). Quando a noção de pecado se enfraquece, a mensagem da cruz perde seu impacto, e o evangelho é reduzido a um manual de autoajuda. É por isso que essa tendência preocupa pastores e teólogos — porque indica uma fé emocional, porém pouco alicerçada na verdade bíblica.
A pesquisa também abordou a relação entre fé e igreja. Sessenta e três por cento dos entrevistados acreditam que “adorar em casa ou com a família é um substituto válido para frequentar uma igreja local”. Esse dado, que cresceu após a pandemia, mostra como o individualismo tem afetado a prática cristã. Muitos preferem a fé privada, sem compromisso comunitário. No entanto, o Novo Testamento ensina que a igreja é o corpo de Cristo e que os cristãos devem congregar para edificação mútua. Apenas trinta e três por cento dos participantes afirmaram acreditar que “todo cristão tem a obrigação de fazer parte de uma igreja local”, o que revela uma compreensão fraca sobre comunhão e discipulado. Quando a vida cristã se torna um ato solitário, perde-se o senso de corpo e missão coletiva.
Outro dado digno de reflexão: quarenta e oito por cento dos americanos afirmaram que “a Bíblia, como outras escrituras sagradas, contém mitos antigos, mas não é literalmente verdadeira”. Isso indica que quase metade da população enxerga as Escrituras como um texto simbólico, e não como Palavra inspirada por Deus. A consequência direta dessa visão é a perda da autoridade bíblica. Se a Bíblia é apenas um livro de sabedoria humana, cada pessoa se torna sua própria autoridade espiritual — e o resultado é uma geração que escolhe o que deseja acreditar, moldando o evangelho aos seus próprios valores. A Ligonier Ministries chama esse fenômeno de “teologia à la carte”, uma fé sob medida, feita para caber no conforto do coração moderno.
Em relação à salvação, cinquenta e oito por cento concordam que “somente aqueles que confiam em Jesus Cristo como Salvador recebem o dom gratuito da salvação eterna”. Apesar de ser um número majoritário, ele mostra que quase metade dos entrevistados rejeita a exclusividade de Cristo. Em contraste, sessenta e cinco por cento creem que Deus aceita a adoração de todas as religiões. Essa contradição reforça que muitos ainda afirmam ser cristãos, mas com um conceito diluído do evangelho — um cristianismo sem cruz, sem arrependimento e sem exclusividade de Cristo. O relatório conclui que há uma “confusão generalizada” mesmo entre evangélicos, resultado de uma geração exposta a múltiplas vozes, mas pouco acostumada a estudar a Bíblia de forma sistemática.
Outro dado preocupante é que cinquenta e quatro por cento dos americanos acreditam que “os cristãos não devem permitir que suas crenças influenciem suas decisões políticas”. Esse tipo de pensamento mostra como a fé tem sido empurrada para a esfera privada. No entanto, a fé cristã é essencialmente pública — ela influencia o caráter, o trabalho, o modo de votar e de se relacionar com o mundo. Quando o evangelho é reduzido a uma experiência interior sem implicações externas, ele perde seu poder transformador. Da mesma forma, apenas trinta e três por cento acreditam que “todo cristão deve se unir a uma igreja local”. Esse número reflete uma crise de pertencimento, onde a espiritualidade pessoal substitui a comunhão, e o “meu relacionamento com Deus” se torna mais importante que o “nosso relacionamento com Cristo”.

Mas o relatório também traz boas notícias. Segundo os pesquisadores, há uma tendência de estabilidade teológica: apesar das transformações culturais, a maioria das respostas manteve-se semelhante às das edições anteriores. Isso indica que, embora a confusão exista, ela não cresce de forma explosiva. As pessoas continuam abertas a falar sobre fé, Bíblia e Jesus. O desafio, porém, é a profundidade dessas crenças. Muitos gostam de Deus, mas “gostam de Deus à sua maneira”, como escreveu Stephen Nichols, presidente do Reformation Bible College. Ou seja, o problema não é a falta de interesse religioso, mas a falta de submissão ao Deus revelado nas Escrituras.
Para quem atua com ensino bíblico, mídia cristã e evangelismo, esse panorama serve de alerta e também de oportunidade. Mostra a importância de comunicar o evangelho com clareza, reafirmar a centralidade da cruz e promover o estudo bíblico regular. No Brasil, onde há um rápido crescimento das igrejas evangélicas e um ambiente religioso plural, o risco de cair nos mesmos erros é grande. Muitos frequentam cultos, mas não sabem explicar o que realmente creem. Outros vivem experiências espirituais, mas desconhecem os fundamentos da fé. A situação americana pode ser um espelho do futuro se não houver investimento em discipulado e formação teológica acessível.
Diante disso, algumas ações práticas podem ser tomadas por líderes, comunicadores e músicos cristãos. Em primeiro lugar, é essencial produzir conteúdo que una fé e verdade — seja por meio de podcasts, músicas ou blogs, o foco deve estar na clareza doutrinária. Ensinar quem é Deus, quem é Jesus, o que significa arrependimento, graça e santificação. Em segundo lugar, é importante resgatar o valor da comunidade cristã. Nenhum culto doméstico substitui a igreja local, e nenhuma espiritualidade isolada produz o mesmo amadurecimento que a comunhão dos santos. Terceiro, é fundamental valorizar a Bíblia como autoridade suprema. Em tempos de opiniões voláteis, precisamos lembrar que a Palavra de Deus não muda com as tendências da cultura. E, por fim, é urgente cultivar teologia nas novas gerações — especialmente nas crianças. Canções, histórias e conteúdos cristãos podem formar a base de uma fé sólida que resista às pressões do relativismo.
A pesquisa “State of Theology 2025” termina com uma frase que resume o espírito do relatório: “Os americanos continuam interessados em Deus, mas querem moldá-lo à sua própria imagem.” O desafio, portanto, é redescobrir o Deus da Bíblia — não o Deus que criamos, mas o Deus que nos criou. Isso exige ensino, humildade e retorno às Escrituras. Para o Brasil, significa investir menos em popularidade e mais em verdade. O avivamento que transforma uma nação não nasce de emoções passageiras, mas de corações instruídos na Palavra. A teologia importa. O que se crê determina o modo como se vive, se canta e se prega. Que essa consciência desperte ministérios, rádios, escolas e igrejas para ensinar a fé de forma fiel, relevante e apaixonada.
